segunda-feira, 12 de abril de 2010

Edição nº36





Entrevista


Genuíno Madruga

Já deu duas voltas ao mundo. Encontrou algum lugar onde achasse que as pessoas fossem especialmente felizes ou satisfeitas com a vida?
Esta pergunta é muito subjectiva, há gente boa e má em toda a parte do mundo. Mas nas ilhas da Polinésia, nomeadamente nas Ilhas Marquesas, a forma de vida daquelas gentes tem pouco a ver com esta daqui dos chamados países ocidentais. E perguntamo-nos afinal o que é civilização? É a nossa, que está dando cabo disto tudo, do clima? Esta civilização do plástico e das latas de coca-cola, da droga, assaltos a bancos e bombas? Nessas pequenas ilhas do Pacífico e do Índico não precisam de polícias. A maior parte delas está livre de drogas porque têm os seus próprios meios de resolver esses problemas. Melhor do que tudo: não há gente miserável como há nos países ocidentais e lá há uma forte e importante ligação com a Terra e com o Mar.

O que é que podia ser feito para que aqui também houvesse uma maior ligação com a Terra e com o Mar?
A Horta é um dos maiores portos do mundo em movimento de iates, mas as pessoas limitam-se a vê-los passar. Mesmo assim já vai havendo um maior número de pessoal com barcos, mas a ligação da Horta com o Mar está principalmente relacionada com a passagem dos estrangeiros, o que eu não compreendo. Só para dar um exemplo, nas Ilhas Marquesas há um dia por semana, a sexta-feira, em que todas as crianças da escola vão aprender a nadar, remar, andar à vela, para além de que nos outros dias à tarde vão todos para o mar, com as suas canoas, etc. A formação básica escolar já traz disciplinas sobre o estudo do mar. Aqui vivemos practicamente de costas voltadas para o mar, apesar de que, nos últimos anos, mesmo assim, houve alguma melhoria. Fundamentalmente a mudança na mentalidade tem que passar pela escola, o ensino têm que estar inserido na nossa realidade: pouca terra, mar e turismo. Porque carga de água é que têm que vir estrangeiros trabalhar para esses ferry boats? Porque carga de água é que quem vai para o mar é quem não sabe ler nem escrever?
Houve recentemente um debate no Parlamento onde se defendeu a construção de uma escola de pescadores nos Açores. Mas como é que isso iria ser feito? E onde? Em São Miguel? Ir estudar para São Miguel exige quase o mesmo esforço do que ir estudar para Lisboa. Eu, por exemplo, estudei em Lisboa. Criar uma escola dessas implicaria custos enormes. Em vez disso porque não implementar-se logo de princípio os ensinamentos básicos sobre o mar, com o intuito de incentivar a rapaziada a gostar e os entusiasmasse então a ir estudar para fora?

Na sua função, como é que contribui para melhorar o nosso futuro?
Falando de coisas práticas, dando exemplo de vida, utilizando os conhecimentos das duas viagens de circum-navegação que realizei, palestrando aos alunos das escolas, tanto os maiores como os pequeninos. Não faço mais porque não tenho oportunidade de o fazer, sou pescador, vivo no mar, nem sempre tenho tempo em terra disponível, mas atendo todos que vão conversar comigo. E estes são temas que a rapaziada gosta muito. O importante é lançar as sementes. Contar-lhes sobre o primeiro barco que tive, construí-o com 12 anos, era uma chata com 2,60m, incentivá-los a realizar seus sonhos, não só dar a volta ao mundo, mas estudar, comprar uma casa, formar-se numa profissão, etc.

Estamos melhor hoje que antes?
Claro que sim, falando da pesca, apesar de todos os problemas que vão condicionando o nosso futuro na pesca, vive-se melhor do mar. A segurança é maior, as condições de vida a bordo são melhores. Mas também é facto que não há muito tempo quem vivia do mar tinha alguma qualidade de vida, o que hoje já não é bem verdade. O futuro é também uma incógnita muito grande e as consequências já aí estão. Na exploração do nosso mar há stocks em ruptura: espécies demersais como o goraz, a boca negra e em muito pouco também o cherne. Mas ainda se continua a aumentar o esforço de pesca!!! Os rendimentos estão a diminuir e os custos, como o combustível, a manutenção dos barcos, os aparelhos, entre outros, continuam a aumentar. Cada vez se ganha menos e vêm a caminho sérios problemas sociais.

Aurora Ribeiro





Colaboradores:

Capa: Gil Teixeira Lopes
Entrevista: Aurora Ribeiro
Cinema e Teatro: Tiago Vouga- Teatro de Giz
Arquitectura e Artes Plásticas: Filipe M. Porteiro
Ciência e Ambiente: Parque Natural do Faial, Cláudia Ávila Gomes

Gatafunhos: Tomás Silva

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